
Eu sempre fui muito tímida. Muito mesmo. Daquelas que sentiam fome e continuavam sentindo fome por recusar o biscoito oferecido pela vizinha. Por VERGONHA ! Sentia vergonha por tudo. Vergonha de falar meu nome. Vergonha de responder "presente" na sala de aula. Vergonha de pedir licença pra ir ao banheiro. Vergonha de reclamar por algo que me incomodava. Vergonha de contrariar. Vergonha de contar que alguém me agrediu de alguma forma.
Mas que doidisse. Culpar os pais não adianta. O meio onde nasci também não. Mas tem mais coisa aí embaixo.
Sentir este tipo de timidez é muito estranho, agora que me lembro da sensação sei como é estranho.
A gente procura não incomodar o resto do mundo e talvez isso seja por baixa estima. Ou um complexo muito grande inferioridade. Mas não é pra descobrir o porque , que estou escrevendo e sim pra contar que estou perdendo a vergonha...a complaciva, a que ainda restava, a que fazia eu continuar sentindo fome ( não mais de comida) por recusar os biscoitos que a vida me oferecia.
Bipolares tem gosto pra tudo. Montanhas - russas ambulantes de duas pernas, oscilam mais que a previsão do tempo do Jornal Nacional.
Para perder a vergonha, vencer a timidez , eu precisei de neurotransmissores entrometidos e convencidos de serem super herois e de alguma disposição.
Tem muita gente que não conta o que dói. Continua sendo sufocado por uma vergonha que amadureceu e depois de adulta recebe outro nome : embotamento.
Já me peguei me embotando ( risos) - parece que tô calçando botas - e aí a gente sempre pára pra se justificar...ás vezes, por que como bipolares, nem sempre temos o controle ( quase nunca), ás vezes por que faz da cultura do individuo mesmo, outras por que não estar dentro da normalidade que o resto da cultura nos impoem é motivo de "vergonha".
Agora eu assumo o que eu realmente preciso e não mais o que agrada o resto do mundo. Agora eu assumo que sem tratamento eu seria nada. Sem tratamento eu continuaria tendo um vazio dentro de mim do tamanho do universo. Agora eu não tenho mais vergonha de rejeitar ou aceitar os biscoitos quando sinto fome. Porque o tratamento me deu algo que eu não conhecia : autonomia. Meu psique tem dona e ela se chama Keila Conci !
A loucura do dia-a-dia, as exigencias de trabalho, do mercado, da familia, continuam sim... mas hoje eu dou o que eu posso dar, agora eu vou até onde consigo ir e não tenho vergonha de dizer que só consigo "até aqui".
Uma amiga me disse que perder-se ás vezes também é o caminho.
Não sinto mais vergonha por não saber a resposta. Nem por admitir que passei um dia inteiro chorando por nada e que francamente, neste dia não produzi nada ! Nada que me valham palmas do restante do mundo ou que acrescente algo para enconomia do país.
Há dois dias, quase me enterrei por tanta tristeza que sentia. Ontem eu estava muito agitada. Hoje está dificil pra não misturar os assuntos e escrever algo que sirva pra você aí leitor. Perdoe a minha insanidade. Ela não serve pra dar conselhos. Mas é atrativa. Ás vezes até eu gosto de me ouvir. Alguns personagens são mais interessantes que os outros, confesso , mas cada um tem seu potencial. E hoje eu não sei bem qual deles usar, mas não sinto vergonha por isso. Afinal, perder a vergonha faz parte da trilha. E eu estou só no começo.
E viva o maluco beleza... aquele não penteia os cabelos e anda falando abobrinhas por aí. Tem uma parte de mim que sente pena. Pena por minha mente não se decidir e continuar neste meio termo: um pouca louca , um pouco sã.
Eu adoria arrastar tijolo com uma cordinha e ouvir todo mundo dizer que é normal !
Tá vendo... eu não tenho mais vergonha.
Fui.