O real esvaziou-se de importância: não interessa se você tem dinheiro, cultura, sucesso. Interessa, isso sim, se aparenta ter. Cada vez mais gente leiloa a individualidade pela aprovação dos outros e se torna um clone fajuto de seres pré-aprovados pela platéia ou uma versão mentirosamente melhorada de si mesmo: por fora, bela viola; por dentro, pão bolorento. Não vejo problema algum em acertar um nariz torto, levantar peitos caídos. O que me amedronta é essa insanidade que leva a um tipo inédito e estúpido de mutilação, a mutilação pró-fama. O que são dores, anestesia, o período angustiante de recuperação perante a cara de espanto dos amigos, o despeito das amigas, os futuros flashes? Nem para os índios na época do descobrimento o espelho era tão fascinante. Eles trocavam um ouro para ter um pedaço de si refletido. Hoje em dia, troca-se de rosto, de corpo, por elogios, muitas vezes fajutos.
Jamais fomos tão carentes de aceitação. Nunca fomos tão egocêntricos.
As débeis que vendem até a alma para ter a bocona da Angelina Jolie ou a cintura da Halle Barry deveriam saber que a primeira se divorciou porque o marido transava até com a fruteira, e a segunda vive sozinha porque não controla o próprio ciúme. Ter dimensões e formas idealizadas não livra ninguém da infelicidade—apenas o transforma num infeliz bonito na foto.
Por favor gente, cuidar só da carcaça não. Isso faz parecer que você é feliz demais. E isso não engana por muito tempo.